Autodisciplina: o que é – Parte 1

Se você está pesquisando o termo autodisciplina na Internet, com certeza está confuso. Mas fique tranquilo, é para ficar mesmo. Existem muitas abordagens e quando comecei a levantar material a respeito em 2010, existiam menos estudos científicos relacionados e ainda assim era difícil conectá-los.

Minha pegunta chave na época era: “Autodisciplina é algo que a pessoa nasce ou ela pode ser construída?
Voltando 10 anos do momento em que escrevo este post, me sentia como um hamister de laboratório que corre, corre e não sai do lugar. Começava projetos pessoais importantes e não dava continuidade. Eu tinha terminado um relacionamento de 3 anos muito conturbado e para piorar, não sentia mais ânimo para trabalhar na empresa onde estava.

Parafraseando Zeca Pagodinho, parecia que eu deixava a vida me levar e não tinha a disciplina de assumir o comando para mudá-la. Você já teve essa sensação?

E foi então que iniciei minha jornada de conhecimento neste assunto e minha mente foi se abrindo para uma compreensão muito mais abrangente das áreas que envolvem a autodisciplina. Neste post vou compartilhar alguns aprendizados com você abordando as seguintes questões:

  • O que é autodisciplina?
  • Quais os componentes da autodisciplina?
  • As crenças limitantes em torno  da autodisciplina

Para não ficar muito extenso, vou dividir o post em dois. Na segunda parte falaremos de: onde a maioria das pessoas falham, quais as técnicas para construir autodisciplina, e por onde começar sua jornada.

Primeiramente vamos começar definindo a autodisciplina.

O que é autodisciplina

Assim como as teorias, encontramos também muitas definições a respeito da autodisciplina.

A Associação Americana de Psiquiatria destaca 3 características principais para definir uma pessoa com autodisciplina:

  • Ter a capacidade de reprimir uma resposta impulsiva que prejudique o comprometimento com algo.
  • Ter a capacidade de adiar uma gratificação, resistindo às tentações de curto prazo, para atingir objetivos de longo prazo.
  • Ter a capacidade de manter-se no controle, mesmo em situação de grande carga emocional ou estresse físico.

Como se pode ver, são características que mostram que uma pessoa disciplinada tem um alto nível de autocontrole (ela controla seus impulsos) mas falta ainda a meu ver, um componente chave. Aquele que garante que esse autocontrole seja feito de forma regular e que assegura a conquista de algo a qual estamos comprometidos no longo prazo: a CONSISTÊNCIA.

Se procurarmos no dicionário, consistência no sentido figurado, você encontrará como significado duas palavras:regularidade e perseverança.

Para facilitar, vamos usar uma definição para autodisciplina que engloba os vários aspectos de uma pessoa disciplinada:

“Autodisciplina é a capacidade de estar no comando de suas ações de forma consistente, independente da situação interna ou externa, para atingir um objetivo pré-estabelecido ou manter o estilo de vida desejado.”

Em síntese, autodisciplina é:
“você no comando de suas ações de forma consistente”

Isso quer dizer que independente do seu estado emocional (situações internas) ou fatores externos que surjam (tentações, imprevistos), você se manterá firme no propósito de conseguir realizar seu objetivo maior.
Esses objetivos normalmente são de longo prazo e exigem da pessoa consistência. Ex: emagrecer, estudar para um concurso, poupar dinheiro para fazer a viagem que sonhou, etc.
A consistência é o que faz a mágica acontecer. Ela une a regularidade de se repetir muitas vezes com a resiliência de voltarmos ao trilho se por acaso falhamos em um momento do nosso percurso. Não adianta ter disciplina de manhã e à tarde não ter. Ou ter num mês e no outro não, e assim por diante. É ela que nos impede por exemplo de interromper um hábito saudável de muitos anos e de repente olhar para trás e sentir aquela sensação desagradável de ter parado o que te fazia bem.

Quais os componentes da autodisciplina?

Se a consistência é a chave, precisamos saber também quais são os outros componentes importantes que ajudam a nos manter no trilho.
Sem dúvida o componente principal é a motivação. Ela é a mola propulsora.
Essa motivação pode ser por algo bom, mas também por medo algo ruim.
Se for bom, pode ser um grande desejo de realizar algo, às vezes por uma paixão. Já a motivação por algo ruim pode ser por medo de perder algo ou das consequências de se manter como está não mudando, por exemplo, hábitos prejudiciais a saúde.
No meu caso por exemplo a motivação foi exatamente esta. Sair do caos de onde estava. Parar aquele sentimento de frustração. Me fiz a pergunta na época: como estarei daqui a 3 anos se não tomasse uma atitude? O péssimo cenário que veio a minha mente, foi o que me fez sair do lugar.

O problema é que nem sempre a motivação, seja ela de qualquer natureza, está à nossa disposição para fazermos algo com empolgação ou empenho.
Quando a motivação falha, entra em cena um fator muito estudado pelos psicólogos:
A força de vontade.

Se você pesquisar na web, irá encontrar alguns artigos dizendo que “você não precisa de motivação, mas sim força de vontade” (que no post é tratada como “disciplina”).

Mas a questão é que o equilíbrio dos componentes é que resultam na sua autodisciplina.

Você pode estar pensando, muitas pessoas tem a capacidade de fazer coisa que que precisariam de grande motivação e a fazem de forma automática. Sem necessariamente estarem motivadas ou terem que fazer uso da sua força de vontade.

Bom, neste caso, é muito provável que ela já tenha repetido tantas vezes aquela tarefa que ela se tornou um hábito. O cérebro já incorporou na aquele procedimento para ela “economizar energia” e poder fazer outras coisas. É por isso que depois de um tempo de prática, conseguimos dirigir um carro e conversar tranquilamente com a pessoa do lado sem ter que ficar toda hora pensando em qual comando do carro teremos que acionar ao dirigir.

Para exemplificar os componentes da autodisciplina, vamos pensar numa situação fácil de visualizar e separar os componentes que citamos.
Imagine que você tem um sonho de participar da corrida de São Silvestre. Você sempre viu os corredores amadores na televisão e pensava na sensação que seria participar daquele evento. Só tem um problema você esta fora da sua forma física e nunca correu mais que 5 km na vida.
Fica claro que a motivação será o ingrediente principal dessa equação. Se não houver a motivação não existe como sair da situação A (não tenho o mínimo preparo) para B (estou apto a correr 15 km com direito ladeiras no percurso).
Haverá um treino de meses antes que isso ocorra. Serão muitas corridas de treino e haverão muitos obstáculos nessa jornada. Você enfrentará dias frios que serão mais difícil de se acordar, e também haverão imprevistos como uma gripe que pode te derrubar por 2 semanas.

Nos dias frios a sua força de vontade irá trabalhar, fará com que mesmo com o seu cérebro gritando para você continuar deitado você levante e vá treinar. Nos imprevistos, o seu foco será na consistência que o fará voltar e tirar o atraso. Será o fato de acreditar que o seu objetivo é construído a cada treino, até o grande dia.
Até que um dia você volta do treino e quando chega em casa percebe que nem havia se tocado que aquela manhã estava congelante e ainda sim você fez uma ótima corrida.

Nesse momento você percebe que a consistência tornou aquele treino um hábito, e provavelmente mesmo depois de correr a São Silvestre, você faça aquela corrida pelo motivo da sensação de bem estar que ela te dá ao começar o dia.

As crença limitantes em torno da auto disciplina

É provável que você já tenha visto alguém meditando e pensou:

“nunca vou conseguir ficar 15 minutos sentado sem pensar em nada. Isso não é para mim.”

Muitos pensam assim, provavelmente a maioria das pessoas. Acontece que os benefícios da meditação são tão incríveis, que fazem muitas pessoas pelo menos tentarem.

E boa parte das que tentarem e persistirem, vão incorporar este hábito para o resto da vida, e como mostram as pesquisas vão ter seu cérebro modificado, só que para melhor.
Isso por que nosso cérebro tem o que os cientistas chamam de neuroplasticidade, que é a capacidade de mudar fisicamente (pra melhor) conforme os estímulos que recebe.
O neurocientista Mischael Merzenich, explica isso em detalhes no seu livro “Como a Nova Ciência da Plasticidade do Cérebro Pode Mudar sua Vida” .

E é esta capacidade que acaba com a primeira crença limitante: ´
#1 – Só tem autodisciplina aqueles que nascem assim. Ou se preferir a frase popular”pau que nasce torto cresce torto”.
Errado. A autodisciplina pode ser CONSTRUÍDA. Sim tijolo a tijolo. Seu cérebro responde a estímulos e se transforma, só depende da sua motivação e da consistência de em se fazer isso.

#2 – Tornar-se autodisciplinado é um processo penoso.
Isso não pode ser tomado como uma regra. Existem técnicas que fazem o processo de conquistar a autodisciplina ser suave e até mesmo prazeroso. Como tudo na vida a técnica e o autoconhecimento faz com que o caminho fique muito mais fácil, pode não ser o mais curto. Não estamos falando de atalho, mas sim de formas que nos fazem chegar onde queremos sem que tenhamos um desgaste que coloque tudo a perder.

#3: ser autodisciplinado é ficar engessado a padrões.Ou o inverso: “pessoas muito criativas são indisciplinadas.”
Muitos acreditam que ser disciplinado é estar preso a rotinas que acabam reprimindo a criatividade da pessoa.Ou ainda que os autodisciplinados ou de certa forma engessa nossa maneira de viver a vida. O famoso filósofo grego Aristóteles tem uma frase famosa que contradiz essa crença e que faz todo sentido: “ Através da disciplina vem a liberdade” .
Quando fazemos aquilo que precisamos fazer, seja nossas responsabilidades do dia a dia ou tarefas que vão nos levar a um objetivo maior, temos mais tempo a nos dedicar ao lazer de corpo inteiro. Não temos aquela sensação desagradável de estar num momento de lazer e pensando “deveria estar fazendo tal tarefa”.

#4: o auto disciplinado é mais infeliz no dia a dia
Provavelmente você já viu alguém comentar algo do tipo “Fulano, não vive! Tá sempre estudando ! Ou então “Esse cara não sabe apreciar o prazer de comer …..(aqui vc pode completar com Big Mac, Coca-cola, ou qualquer comida não saudável mas que para muitos é o sinônimo de grande prazer.
Foi pensando nisso que o psicólogo Wilhelm Hofmann resolveu descobrir se as pessoas que eram mais disciplinada no dia a dia eram menos felizes por conta de terem várias renúncias de gratificação de curto prazo em sua rotina.
Por meio de testes e estudos, Hofmann e sua equipe chegaram a conclusão que as pessoas com mais autodisciplina eram mais felizes no dia a dia que a média que não tinham essa característica. Você pode entender melhor como a pesquisa neste post.

Chegou até aqui no post?

De alguma forma este post te motivou a conhecer mais sobre o tema e você é um sério candidato a construir sua autodisciplina. Se a motivação é a força que precisamos para sair da inércia, lembre-se que a consistência é que faz a mágica acontecer.
Continue sua busca! Temos a parte 2 deste post, lembra?
Uma das técnicas que usamos para fazer algo grande é dividi-lo em partes :-).

Na parte 2 deste post abordaremos os 3 pontos críticos aonde  a maioria das pessoas falham na sua jornada para construir sua autodisciplina e alcançar seus objetivos.

Este conteúdo foi útil para você? Seu comentário é sempre muito bem vindo e será respondido.

Nos vemos no próximo post!

Forte abraço!